Osasquense relata sua luta contra o Covid-19

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Por Ricardo Guerardt

Sim, eu testei positivo para o COVID-19! Já se passaram três semanas e vou compartilhar como foram os meus dias.

Dizem que no Brasil a maioria das pessoas não teve febre alta, e este foi o meu caso. Dores no corpo, calafrios, dores de cabeça, congestão nasal, tosse e respiração estranha foram os sintomas que me acompanharam nesta trajetória.

Tive, ainda, um outro sintoma! Um que não foi reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e nem pelo Ministério da Saúde (MS), mas que posso lhe assegurar que foi o que mais me causou “desconforto”.

Como não está catalogado, vou chamá-lo de “percepção aguçada”, e vou compartilhar os efeitos que teve sobre mim.

Quando os primeiros sintomas apareceram, num final de semana após uma viagem de trabalho em São Paulo (sou osasquense, mas moro em Santa Catarina), alertei a minha empresa e decidimos, para o bem de todos, que fosse melhor aguardar o resultado em casa para garantirmos a segurança de todos, mas no momento da consulta, os médicos já me alertaram que a possibilidade de estar infectado era grande, e que seria melhor iniciarmos o isolamento.

Assim começou a minha (e da minha família) saga do isolamento e onde os sintomas foram intensificados. Assim que compartilhamos esta informação com as pessoas, PERCEBI (lembram do sintoma né?) todos os tipos de olhares.

PERCEBEMOS os olhares de culpa, como se intencionalmente tivéssemos (incluo a minha esposa aqui porque sofreu mais do que eu) contraído o vírus e disseminado para a maior quantidade possível de pessoas. Fizeram-na sentir responsabilidade pela “possibilidade” de ter repassado o vírus a alguém, mesmo que o contato tenha acontecido antes da suspeita.

Estas nunca nos perguntaram se estávamos bem, mas queriam saber o resultado do exame. Acreditem, após alguns dias nós entendemos a situação, e PERCEBEMOS que as pessoas estavam com medo e agindo com instinto de preservação.

Em contrapartida, como tudo na vida, PERCEBEMOS muito amor, carinho e preocupação de algumas pessoas. Um interesse genuíno em saber se estávamos bem. Um interesse sincero em ajudar da forma que fosse possível. Recebemos muita atenção dos amigos (amigos de verdade) e da nossa família, estes sim, se preocuparam, choraram, oraram. Estamos longe de casa, do acalento da família e, nestas horas, isto tem um peso enorme.

PERCEBI que por mais que a gente não se fale todos os dias, família é o porto seguro, é aquilo que você pode contar, não importa a distância, a situação, o momento. Eles sempre estão lá, para te colocar pra cima e fazer você se sentir amado. Pra mim, os olhares de AMOR se sobrepuseram aos de culpa, fazendo com que qualquer sentimento de mágoa se apagasse dentro de mim. Ah sim, este é o poder do amor.

PERCEBI, nestes dias de isolamento, que o meu tempo é muito valioso, e que preciso usá-lo de forma mais consciente, producente, coerente. Todos reclamamos de falta de tempo, mas o que vi nestes dias de quarentena foram pessoas usando seu tempo para fazer “nada”. Pessoas ocupando seu dia vendo notícias na TV, que estão mais preocupadas em prender a audiência a qualquer custo do que informar.

PERCEBI pessoas passando seus dias inteiros nas redes sociais, vendo tudo, e ao mesmo tempo nada.

PERCEBI empresas que de fato se preocupam com seus funcionários, e aquelas que dizem apenas da boca pra fora.

PERCEBI que os políticos possuem uma capacidade sórdida de transformar uma pandemia, um problema de saúde pública, em cenário político eleitoral.

PERCEBI que este vírus não trouxe apenas o medo, mas a verdade. A verdade sobre os relacionamentos! Escuto muitas pessoas reclamando de suas esposas, seus maridos, seus filhos.

PERCEBI pais frustrados, “surtando” porque seus filhos estão em casa.

PERCEBI pais reclamando que seus filhos estão comendo muito, e que tem um monte de tarefas de casa pra fazer.

PERCEBI pais estressados, que não veem a hora desta quarentena acabar para que suas vidas voltem ao “normal”. Sim, eu sei que não é fácil, não sou um hipócrita e muito menos julgador, não me cabe este papel.

É uma situação nova pra todo mundo, e as realidades das famílias são diferentes, mas preciso dizer que tenho mais compaixão das crianças que vivem nestes lares. Tenho mais compaixão das crianças que não possuem compreensão do momento, que estão perdidas, estressadas e entediadas, desesperadas por um pouco de atenção, mas não encontram o suporte necessário nos pais para enfrentarem este momento.

PERCEBI casamentos frágeis, que serão dissolvidos após esta quarentena.

PERCEBI maridos e esposas se perguntando: “porque me casei com esta pessoa”?

PERCEBI, neste período de isolamento, que meu mundo inteiro estava dentro da minha casa.

PERCEBI o quanto a minha esposa é maravilhosa e o quanto sou privilegiado por receber tanto amor, tanto carinho e tanto cuidado.

PERCEBI, de forma mais intensa, o quanto ela se dedica à nossa casa, à nossa família, à nossa filha.

PERCEBI que ela transformou a quarentena da Nicole, nossa filha, em “férias dentro de casa”, com tarefas de forma lúdica e divertida, brincadeiras, vídeos, looks etc.

PERCEBI que a liberdade é algo maravilhoso, e que temos que valorizar.

PERCEBI muita gente descrente, desesperada, desesperançada!

Mas também PERCEBI que Deus, nosso Pai, está sempre cuidando de nossas vidas, nos dando oportunidades de PERCEBER a beleza do amor, da fraternidade, da solidariedade e da compaixão.

Enfim, PERCEBI que “as misericórdias do Senhor se renovam a cada manhã”, e que esta é a minha esperança: “Porque Ele vive, posso crer no amanhã”.
 

2 thoughts on “Osasquense relata sua luta contra o Covid-19

  1. Tudo que foi narrado no texto é verdade. Esse virus está ensinando a nos humanos como devemos valorizar mais as coisas e todos ao nosso redor. Boa sorte guerreiro e parabéns por compartilhar sua luta para ficar bem com nós.

  2. Parabéns. Excelente análise do momento que vivemos. Este deve chegar nas grandes imprensa seria como Jovem Pan.

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