Para quem gosta de história, Barueri dá aulas numa linha do tempo que se perde além de 1949. A cidade apaga 73 velinhas nesse sábado mas com uma estrada que vem desde as batinas jesuítas – com as bênçãos do padre José de Anchieta em 1560.
Mas há controvérsias que jogam o nascimento de Barueri para o século seguinte, com o padre João de Almeida em 1610. Certo, para os 73 anos municipais de agora, são datas que se perdem e o cidadão modernoso nem tem interesse sobre qual batina a história elege.
Num cenário quase que amazônico, os jesuítas rasgam cerca de 30 quilômetros de São Paulo e estabelecem uma aldeia indígena – é o começo de tudo e estamos falando de pouco mais de três décadas após o descobrimento do Brasil.
Acelerando na história, essa aldeia logo se torna povoado, depois freguesia e cresce até se tornar distrito vinculado a Santana de Parnaíba; e avançaria ainda mais a partir de 1875 com a inauguração da estação da Estrada de Ferro Sorocabana.
Com esse apetite imparável, natural que os baruerienses começassem a pleitear por bandeira própria – e chegaram lá em 24 de dezembro de 1948, quando o governador Adhemar de Barros assina a criação do novo município. No entanto, a data de aniversário conta-se com a primeira prefeitura e Câmara de Vereadores em 26 de março de 1949.
Bem, com essa breve revisão histórica, agora o leitor pode pegar o bonde do tempo e recuar a 1875 porque não se perde mais – e encontra Barueri ainda Santana de Parnaíba, vê a chegada da estrada de ferro, as portas da região escancararem-se para o progresso e a roda do comércio girar num avanço espetacular.
Contando dessa inauguração da estação de trem, o leitor soma mais quatro décadas para o primeiro time de futebol – e vê nessa mesa de resenhas João Fernandes, Joaquim Barbosa, Napoleão e Humberto Berzaghi, José Firmino, José Farbo e Heitor Ariente como pais do Barueri Futebol Clube.
Os diretores Napoleão, Heitor e Farbo também eram jogadores – deixavam a cartola de lado e partiam para as quatro linhas. Da fundação e nas décadas seguintes só dava Barueri FC – enquanto isso o leitor segue avançando e em outras paradas vê surgir camisas fortes como 1º de Maio em 1947, Belval no ano seguinte, Cruzeiro do Sul e 10 de Setembro em 1950 mais o Silveira em 1958.
FUTEBOL E A CIDADE
O Barueri FC não era só futebol, tinha expediente de clube mesmo – realizava bailões e espetáculos teatrais com vários jogadores pintando também como atores.
O bonde do tempo segue viagem e para no festivo março de 1949 – o então distrito ligado a Santana de Parnaíba é um foguetório só com bandinha e procissão pela emancipação. Muita alegria na novíssima cidade e o leitor, nessa festa toda, volta o olhar para o fundo do palco e encontra lá o Barueri FC já com 30 anos de futebol.
O clube, portanto, antecede esse movimento político por já levar Barueri como escudo desde 1919; com a chegada da emancipação, reforça essa soberania municipal como agremiação sólida, de raiz profunda e intensa atividade social.
LEGADO DAS QUATRO LINHAS
Quando o Barueri FC foi fundado, estava rolando o VII Campeonato de Foot-Ball da Associação Paulista de Sports Athleticos – ancestrais do Paulistão e da Federação Paulista de Futebol.
Esses torneios primitivos são reconhecidos pela FPF e contam nas estatísticas dos clubes. O começo do campeonato em 1919 foi em 27 de abril. Então, três meses depois nasceria o Barueri FC.
Claro, a moçada do terrão acompanhava o estadual como podia e viu chegar dezembro com o Paulistano campeão pela quarta vez consecutiva, feito que a FPF reconhece e destaca como recorde.
Mas o leitor encontra-se em 1949, ano de muitas festividades municipais e com o futebol bombando; entra numa salinha qualquer e vê a diretoria do Barueri FC naqueles ajustes – discussão por sede própria, pois o campo onde joga está sendo assentado e dará lugar à Vila São João.
Carapicuíba ainda é bairro de Barueri e a diretoria pensa num local na Vila Ceres – não daria certo. Mas como o clube é acertadinho e bem administrado, tem um terreninho no Jardim dos Camargos e usa o imóvel como investimento, venda que possibilitaria construção da sonhada sede social.
Ah, quanto a essa parada do bonde, agora o leitor está em 1957 e com o município bem criança ainda, oito aninhos contra os 38 do Barueri FC. Hoje, na área central da cidade o número 235 da Avenida Dom Pedro II testemunha essa história – é passar por lá e tomar aquele cafezinho servido pelo tempo.
Por fim, o bonde se despede ao chegar nos atuais 73 anos da cidade que tem uma arena de futebol entre as mais belas do Brasil; nesse palco joga o Oeste FC, hoje nas quartas-de-final da Série A2 do Campeonato Paulista e muito bem cotado ao acesso.
Diante desse cenário grandioso, falar do pioneiro Barueri FC parece nada a ver, coisa de saudosismo mumificado. Mas se a cidade vive o auge de agora, deve-se àqueles que lá atrás batalharam arduamente para isso. Sim, estruturando o esporte e envolvendo a coletividade por décadas, o clube atuou como soldado valente na fortificação desse sentimento ao nome Barueri.
Quando os munícipes soltavam fogos pela emancipação, 73 anos atrás, o grito de exaltação que tomava conta era o mesmo de 1919 com o Barueri FC entrando em campo pela primeira vez. Pedindo licença aos fatos e ousando entrar na poesia do futebol, até parece que tudo nasceu mesmo dentro das quatro linhas – grito de gol que hoje é sublime declaração de amor à cidade.