As melhores cidades do mundo para se viver

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Por Vitor Meira França

Assim que voltei para Osasco, bastou a Economist Intelligence Unit divulgar o ranking anual das “melhores cidades do mundo para se viver” para um amigo rapidamente me enviar o “meme” no qual Osasco é ironicamente colocada no lugar de Osaka (Japão) no top 10.

“Pois eu amo Osasco, para mim nossa cidade é o melhor lugar do mundo”, responde uma amiga osasquense raiz ao receber a mensagem. “A grama do vizinho é sempre mais verde”, provoca outro, emendando a famosa frase atribuída ao Tom Jobim: “Viver no exterior é bom, mas é uma merda. Viver no Brasil é uma merda, mas é bom” – frase que de fato resume muito bem o drama de boa parte dos meus amigos imigrantes que vivem em países desenvolvidos.

O que o ranking da Economist Intelligence Unit faz é tentar medir a qualidade de vida das cidades em termos objetivos. Para isto, ela criou o Índice Global de Habitabilidade, que classificou 173 cidades e analisou mais de 30 fatores relacionados a saúde, cultura, meio ambiente, educação e infraestrutura.

Qualquer avaliação pessoal a respeito da qualidade de vida em uma cidade, porém, vai depender não somente de indicadores objetivos, mas também das preferências de seus moradores – estas influenciadas, por sua vez, por questões afetivas ou tão subjetivas que nem sequer conseguimos identificá-las.

O debate mencionado acima deixa mais do que claro que, quando o assunto é qualidade de vida, não apenas indicadores e questões objetivas são importantes, mas aspectos subjetivos também influenciam bastante a percepção dos moradores.

São Paulo, por exemplo, apareceu no ranking de 2023 do Índice Global de Habitabilidade na 7ª posição entre as melhores cidades para se viver na América Latina. Ainda assim, pesquisa da Rede Nossa São Paulo do mesmo ano revela que pelo menos 60% dos moradores da capital sairiam da cidade se pudessem. Que cidade é esta que, pelo ranking, parece oferecer alguma qualidade de vida para seus moradores, mas da qual a maioria da população quer fugir?

Talvez a explicação passe pelo fato de que falar de qualquer grande cidade como São Paulo, com seus mais de 11 milhões de habitantes, assim em termos tão gerais, pode mesmo ser bem problemático. Afinal, há muitas realidades diferentes dentro dessa mesma cidade.

No centro expandido, por exemplo, temos distritos como Perdizes, Consolação, Santa Cecília e Bela Vista, que contam com alta densidade populacional e indicadores de desenvolvimento humano semelhantes aos de países desenvolvidos. Já bairros afastados do centro, como Brasilândia, Itaquera, Itaim Paulista e Capão Redondo, são locais mais carentes de infraestrutura que, apesar da elevada densidade populacional, contam com poucas opções de lazer, cultura e entretenimento, além de sofrerem mais com problemas relacionados a mobilidade e violência.

As contradições da cidade segregada também se fazem notar dentro dos próprios bairros ricos e valorizados, que sofrem com problemas como congestionamentos, moradores de rua, degradação de espaços públicos, violência e sensação de insegurança.

Osasco, com seus mais de 700 mil habitantes, também apresenta uma significativa segregação socioespacial. As Zonas Norte e Sul, separadas pela Rodovia Castelo Branco, pelo Rio Tietê e pela linha do trem, apresentam realidades e desafios distintos.

A Zona Sul, por sua vez, também é bastante heterogênea. Bairros mais próximos da região central, como Centro, Km 18, Jardim das Flores e Bela Vista, assim como os bairros Presidente Altino, Vila Yara, Industrial Autonomistas, Vila Campesina e Umuarama, próximos da divisa com São Paulo, apresentam indicadores de desenvolvimento humano mais altos do que bairros mais ao sul da cidade.

Nada disto, porém, invalida o esforço de tentar classificar as cidades, em termos de qualidade de vida, de forma objetiva. O amor incondicional pode ser muito bonito nas histórias românticas, mas não deveria nos cegar quando o assunto é a vida na cidade. Por mais que o tema seja influenciado por aspectos subjetivos, avaliar indicadores ainda é a melhor forma de identificar problemas, pensar em soluções, implementá-las e avaliar se elas estão ou não dando o resultado esperado.

Rankings como os da Economist Intelligence Unit, por fim, ainda nos apresentam listas das cidades mais desenvolvidas do mundo e nos convidam a conhecer, por exemplo, o que elas têm feito para enfrentar os grandes desafios das cidades contemporâneas ligados a questões como habitação, mobilidade, transição energética, verde e meio ambiente.

Osaka, por exemplo, é um dos principais centros de negócio do Japão, que, além da elevada pontuação no Índice de Habitabilidade em itens como segurança, atenção médica e educação, se destaca por apresentar uma extensa rede ferroviária e um custo de moradia relativamente baixo.

Em outro artigo aqui no Correio Paulista, comentei que Osasco vem sofrendo com uma forte alta dos preços dos imóveis nos últimos anos. Será que temos algo a aprender com Osaka – e outras cidades do Japão – no que diz respeito a custo de moradia?

Pois sim, com certeza temos muito a aprender com elas. De maneira geral, a resposta para o custo relativamente menor da moradia nas metrópoles japonesas está no melhor aproveitamento do espaço urbano, com o estabelecimento de padrões menos restritivos de construção, o que garante um maior crescimento da oferta de moradia. A predominância do uso misto dos imóveis, com muitas pequenas lojas nos bairros, também parece estar por trás de lugares tão agradáveis para se viver.

Para quem se interessou pelo tema, deixo a indicação dos artigos “Por que Tóquio é sete vezes mais acessível que São Paulo?” de Luiz Eduardo Peixoto, e “Por que as cidades japonesas são tão agradáveis para se viver”, de Noah Smith, ambos publicados no Caos Planejado.

(*) Como voltei a trabalhar em São Paulo – e, portanto, ficarei longe do dia a dia de Osasco –, deixarei, temporariamente, de publicar as minhas colunas quinzenais aqui no Correio Paulista. Aproveito para agradecer à toda a equipe do jornal e, especialmente, aos leitores. Quando voltar para Osasco, pretendo, se possível, retomar aqui neste espaço as discussões e reflexões sobre o desenvolvimento urbano da cidade que tive o prazer de dividir com vocês nos últimos meses.

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