“Osascoin”, Uma Moeda Social Digital Para Osasco

Capa Colunistas Vitor Meira França

Por Vitor Meira França

Uma das coisas divertidas a respeito de Osasco, nossa querida “Oz”, é a vasta gama de trocadilhos, combinações e brincadeiras que podemos fazer relacionadas ao nome e ao carinhoso apelido da cidade.

Para além da referência mais óbvia ao “Mundo Mágico de Oz”, da mistura de “Oz” com “ostentação” ou “tentação”, por exemplo, podemos falar em “oztentação”, termo apropriado tanto para ironizar o comportamento dos ricos cafonas da cidade quanto para nomear um bordel ou um sex shop na região central.

Quem nasce em Osasco, osasquense. Quem tem fé – seja no que for –, em Osasco, “osascrente”. Pessoas sórdidas ou comportamentos repugnantes, por aqui, podem ser classificados como “osasquerosos”. Um festival de música, “osasconcerto”; algo quebrado, “osasconserta”; algo engraçado, “osascomédia”; um início, “osascomeça”; um meio, “osasconecta”; um fim, “osas… cabou?”.

“Noz”, aquela fruta seca que comemos principalmente no Natal, em Osasco também é pronome da primeira pessoa do plural. E os muitos tipos que aqui vivem podem ser chamados de apáticoz, autênticoz, cínicoz, sádicoz, céticoz, exóticoz, excêntricoz, cômicoz, patéticoz, fanáticoz, pragmáticoz, metódicoz, sarcásticoz, sistemáticoz, enigmáticoz ou melancólicoz. Uffff…

Provavelmente por ser economista – e influenciado pelo destaque dos bitcoins e demais criptomoedas no noticiário –, pensei que Osasco poderia ter sua própria moeda social digital; e que essa moeda poderia se chamar “Osascoin”.

Brincadeiras à parte, moedas sociais são ótimas formas de promover inclusão financeira e, principalmente, fortalecer as economias locais, já que seu uso fica restrito a um território específico. Entre os municípios brasileiros, o caso mais famoso é o da Mumbuca, em Maricá (RJ), usada para o pagamento de benefícios sociais a cidadãos cadastrados em programas do município.

A ideia do Osascoin surgiu há pouco tempo. O ano era 2020 e o mundo atravessava os primeiros meses da pandemia de Covid-19. Eu havia acabado de voltar para Osasco depois de um longo período vivendo e trabalhando em São Paulo e, nas discussões sobre como reaquecer a economia da cidade após os impactos das restrições impostas pela pandemia, surgiu a ideia dos Osascoins, que nada mais seriam do que créditos tributários em forma de moeda social digital gerados pelo consumo no comércio local.

Ao comprar no comércio local, o cidadão osasquense receberia Osascoins em uma carteira digital e poderia utilizá-los, por exemplo, em descontos nos impostos, pagamento de multas de trânsito, zona azul, passagem no transporte público e consumo no comércio local. A Prefeitura subsidiaria o sistema via renúncia fiscal no valor de cada Osascoin utilizado.

Conversando com colegas da Prefeitura, percebemos que a geração de créditos tributários poderia ir muito além do consumo no comércio local e ser utilizada para incentivar ações de cidadania como pagamento à vista do IPTU, utilização de transporte público ou bicicleta, emprego de cidadãos osasquenses em situação de vulnerabilidade, reciclagem do lixo, implantação de painéis de energia solar e sistema de captação de água da chuva, desenvolvimento de agricultura urbana, adoção de animais, reforma e padronização de calçadas, boa frequência escolar dos filhos na rede municipal, ida a consultas de rotina na UBS, acompanhamento pré-natal, atualização da carteira de vacinação, plantio de árvores em frente de casa, entre outras.

Em outras palavras, os Osascoins funcionariam como uma ferramenta de cidadania com objetivo de incentivar tanto o consumo no comércio local como práticas dos munícipes que gerem externalidades positivas (benefícios para a população como um todo). A moeda digital ainda poderia ser utilizada em programas de transferência de renda como o Nosso Futuro – que já estabelece incentivos relacionados à educação das crianças e saúde das famílias – e benefícios como o vale alimentação dos servidores municipais.

Sei que soa meio “Black Mirror”, uma espécie de “gamificação” da cidadania, transformando a vida na cidade em um tipo de jogo no qual os cidadãos são recompensados de acordo com as suas ações. Riscos devem ser avaliados e mitigados, é claro, mas são indiscutíveis as possibilidades que a ferramenta representa em termos de aperfeiçoamento de políticas públicas, uso de incentivos econômicos e aplicação de preceitos das ciências comportamentais. É fato também que a ideia já vem sendo aplicada em algumas cidades e tende a ganhar cada vez mais força e se espalhar mundo afora.

Descobrimos recentemente, por exemplo, que Cascais, em Portugal, já implementou o “City Points Cascais”, ferramenta que “permite acumular pontos ao realizar ações predefinidas e trocar os pontos por vales de produtos ou serviços oferecidos pelos parceiros locais que adiram à City Points”, conforme explica o site do governo local. Em linha com a ideia do Osascoin, o City Points também “visa promover boas práticas de cidadania e reconhecer os cidadãos […] que contribuem ativamente para a sustentabilidade local”.

Em Florianópolis (SC), uma ação semelhante foi implantada para envolver os próprios moradores dos bairros na zeladoria urbana. Para isso, foi utilizada a Plataforma AMA – Agentes do Meio Ambiente, que conecta e remunera cidadãos que colaborem e participem de programas de educação ambiental, limpeza e zeladoria urbana, logística reversa, fazendas urbanas, compostagem, entre outras ações.

É claro que o Osascoin é uma iniciativa extremamente complexa, que envolve integração de bases de dados, modelos de precificação, desenvolvimentos tecnológicos e, o mais importante, demanda grande participação da população e das empresas do município para ter êxito e atingir seus objetivos.

Osasco, porém, é uma cidade rica e populosa, sede de grandes empresas inovadoras, que tem se firmado como referência em tecnologia e inovação; uma iniciativa como essa sem dúvida pode representar mais uma marca importante para a cidade nesse sentido.

A moeda social digital ainda tem potencial para gerar grande identificação com a população local e aumentar a sensação de pertencimento e o orgulho de se viver na cidade.

Como já disse, é questão de tempo para a ideia se espalhar e ser implantada em muitos lugares mundo afora. Uma coisa, porém, é certa: dificilmente outra cidade terá uma moeda social digital com um nome tão legal quanto “Osascoin”, não concordam?

(*) A arte do “dinheiro osasquense” que abre este artigo é obra do meu amigo e talentoso designer Rafael Cesani Braga.

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