Esses garotos furacões de um jogo no Rochdalão, rodam o mundo em quatro décadas de futebol

Capa Colunistas Esportes Márcio Silvio

Antônio Júlio Baltazar e Tony Marchetti mudaram para sempre o jeito de fazer rádio em Osasco. Eles transformaram um projeto em um case de sucesso. A equipe Furacão nos Esportes rompeu todos os desafios e geração por geração, levou o nome da cidade para diversos lugares do mundo.


 

Que tal passear pelas feiras da Coreia do Sul, aproveitar um final de tarde na Champs-Élysées, subir num camelo para vencer as areias do Saara ou se divertir no tráfego alucinado de Lima? Sim, também entram pontos históricos da Europa que sangrou na II Guerra Mundial e momentos de prece na Basílica da Natividade e no Muro das Lamentações.

Antônio Julio Baltazar e o professor Wanderley Luxemburgo

A viagem não para e segue para os mais de 3.600m de altitude de La Paz, capital boliviana; e se altura não é problema, cabe embarcar rumo ao teto do mundo, rasgar o vento gélido do Tibete ao Nepal e se espantar diante do colossal Everest; mantendo o roteiro frio, vale provar uma vodka original à beira do Rio Moscou após andar pela Praça Vermelha e se encantar com as cúpulas coloridas da Catedral de São Basílio.
Partir em seguida para a vastidão do continente africano e diante de culturas e etnias de mais de 50 países não é problema; também há tempo para a terra do Tio Sam, cruzar a famosa ponte de São Francisco na ensolarada Califórnia, mas não sem antes apreciar o espetáculo que são as floradas das cerejeiras no Japão.
Essa viagem colossal tem um roteiro de quatro décadas e as fotos que marcam esses momentos são centenas; para cada foto há uma história, para cada história há personagens centrais e figurantes. Sim, tudo isso em torno do esporte e em nome do futebol.

O novato piloto Rubens Barrichello ao lado de Tony Marchetti

Antônio Júlio Baltazar deixa de lado os saudáveis 81 anos e volta no tempo a cada imagem. Mais que falar das aventuras esportivas, aponta essas décadas de fotos como testemunhas de um trabalho estupendo levando o nome de Osasco por todo planeta. Com ele, Tony Marchetti (78 anos) numa dobradinha que incomodou a grande imprensa brasileira. E tudo começou num jogo entre Monte Negro e Orlândia no estádio do Rochdale – Baltazar era um jornalista jovem e ousado, Marchetti curtia aposentadoria recente do futebol profissional.“Eu decidi me aventurar naquele jogo pra ver no que dava”, lembra Baltazar. Sabendo da ousadia do amigo, chega Marchetti, ex-atacante da Portuguesa: “Eu posso fazer as reportagens”. Daquela transmissão despretensiosa vingaria a Furacão nos Esportes e que varreria o mundo cobrindo oito Copas do Mundo, dois Jogos Olímpicos, as principais temporadas da seleção e, sim, o futebol brasileiro e regional. “Depois daquela estreia no Rochdalão, nós não paramos mais. Aonde a gente chegava o pessoal dizia: ‘olha aí os meninos de Osasco’. Claro que no início foi tudo muito difícil porque era a gente contra as grandes emissoras. Mas continuamos e o reconhecimento não tardou”, segue Baltazar. “Fizemos grandes amizades e até hoje cultivamos amigos”, completa Tony Marchetti. “Zagallo, João Saldanha, Orlando Duarte e tantos outros feras da imprensa foram muito gente fina. Mas também tivemos algumas desavenças, não com o pessoal do rádio, mas com o da tevê, a Globo.”
Em 1995 a seleção brasileira cumpriu amistoso contra Israel em Tel Aviv e a Furacão nos Esportes foi a primeira equipe brasileira a garantir transmissão – entre outras cinco. Então chegou a poderosa Globo com Galvão Bueno. Acontece que o pacote de emissoras já estava fechado, a Globo ficou de fora e ofereceu muita grana para comprar a vaga da Furacão – foi quando Galvão Bueno ouviu um forte não de Baltazar e Marchetti.
E num outro momento, o mesmo locutor global chegou atrasado para credenciamento e foi direto à boca do caixa para resolver a parada, furando a fila na maior naturalidade. É quando ele ouve uma voz arretada: “Do jeito que a Globo pagou pra estar aqui, a Furacão também pagou. Você não pode chegar furando a fila assim, vai lá pra trás”. Era Tony Marchetti colocando a celebridade no devido lugar. “Depois disso ele cortou de vez o papo com a gente.”
Quanto a Olimpiadas, a Furacão tem Barcelona 1992 e Atlanta 96; a lista de Copas do Mundo é maior começando no México em 1986 e seguindo por Itália 90, EUA 94, França 98, Coreia-Japão 2002, Alemanha 06, África do Sul 10 e Brasil 2014. “Acho muito difícil essa marca ser batida na imprensa regional. Nós fizemos uma grande loucura, mas colocando a Furacão nos Esportes na história, sempre com o nome de Osasco estampado”, destaca Baltazar.

 

Maior torcida organizada do vôlei brasileiro tem nome tirado da Furacão

Antônio Júlio Baltazar e Toni Marchetti não foram exclusivos do futebol. Em meados dos anos 90 chegavam duas modalidades para mudar o mapa esportivo de Osasco – o basquete feminino e o vôlei feminino do BCN. De pronto, a torcida foi lotando o Liberatão de Presidente Altino e fazendo o entorno das estrelas que desfilavam em quadra.
A Furacão nos Esportes também entrou nessa torcida e cuidou de transmitir jogos. “Naquela época não tinha essa de digital, tudo era na unha e a gente precisava se virar”, comenta Baltazar.
E num dos jogos do vôlei no Liberatão, festa nas arquibancadas e a Furacão dizia que os torcedores de Osasco pareciam uns loucos pulando sem parar. “Nós estávamos ligados e gostamos disso”, conta Inajara Martinho, que fundaria a torcida organizada Loucos de Osasco, hoje uma referência também na América Latina.
“Nós já transmitimos jogos em beira de campo, em cabines sendo agredidos por torcedores contrários enfim, temos mesmo muita história pra contar. Hoje não dá mais pra essas loucuras porque a idade não deixa, mas não estamos aposentados do esporte. Aliás, há propostas pra que a Furacão retorne”, revela o jornalista.
Sobre voltar ao microfone, Tony Marchetti reforça que não será naquela pegada maluca. “Não temos mais condições, claro. Jamais volta a fazer campo (reportagens). A ideia hoje é para uma Furacão mais tranquila porque temos muita história pra contar. O que era pra ser feito, nós fizemos.”

 

Candidato a prefeito de Osasco pela chapa Furacão, Baltazar adaptaria para o esporte

Ele sempre gostou de política e faltou pouco para não vestir esse terno em definitivo. Nas eleições de 1977 e para escolha de quem ficaria no lugar do então prefeito Francisco Rossi, o jovem Antônio Júlio Baltazar surgiu como novidade eleitoral.
Na época ele ainda não havia escolhido o esporte e aceitou compor a chapa Furacão. Isso mesmo, Baltazar saiu candidato e a sigla partidária teve cerca de 24 mil votos agregados da Arena – quem venceu em 1977 foi Guaçu Piteri/MDB. “Gostei do nome da chapa, um nome forte. Mais tarde adaptei para a equipe de esporte e gostei mais ainda”, revela.
Acontece que quando começou a transmitir jogos e a aparecer entre a grande imprensa, Baltazar e Tony Marchetti não escaparam de brincadeiras e zoações por causa do nome. Entre outras piadinhas, ouviam que a Furacão seria um ventinho que não duraria nada. Mas não foi assim e quem apostava contra ficou caladinho diante do crescimento da equipe. “Um fator importante a nosso favor é que a gente tinha grandes patrocinadores. Isso dava um respeito danado”, observa Marchetti. De importantes lojas da região à fortíssima Osram do Brasil, a Furacão nos Esportes ainda levava uma instituição megapoderosa como o Bradesco.
E além de contar com uma estrutura desse porte, Baltazar e Marchetti sempre circularam muito bem nos bastidores políticos e isso também reforçava a sustentação do projeto – em Barueri e em Osasco.
Os quase quarenta anos ininterruptos de Furacão nos Esportes é prova mais que suficiente desse sucesso. “Alguém fazer o que nós fizemos já acho bem difícil; fazer mais que a Furacão fez, acho que não vai dar pra ninguém da imprensa”, concluiu Baltazar.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *