Um dos pratos que mais faço em eventos é o Baião de Dois. É um prato tradicional do nordeste, principalmente do Ceará e cheio de curiosidades e porque não dizer musicalidade. Já fiz várias oficinas gastronômicas onde preparo e comento sobre seus ingredientes. Para essa primeira coluna vou homenagear esse delicioso prato brasileiro.
Você já tentou falar algumas palavras de outro idioma e se enrolou? Pois foi mais ou menos assim que surgiu o nome Baião. Os africanos que moravam na Bahia se enrolavam para falar a palavra “baiano” e saia um tal “baião” que era o nome que deram a uma dança que faziam. O termo “de Dois” vem da adição dos dois ingredientes principais, o arroz e o feijão de corda. No caso do ritmo africano era a referência do homem e da mulher.
No Brasil, existem várias receitas diferentes de Baião. Uns usam o feijão fradinho, outros carne seca, outros ainda adicionam nata. Eu vou sempre pelo básico que é certeza de sucesso. Aliás o meu Baião de Dois respeita até a simbologia do número dois. Arroz e feijão, linguiça e carne de porco, manteiga de garrafa e queijo coalho. Tempero o Açafrão não pode faltar e os outros fica a gosto do cozinheiro. Eu utilizo muito o chimichurri.
Como a maioria dos pratos brasileiros, o Baião de Dois também teve origem humilde, preparado com restos de arroz e feijão e modificado através do tempo. Alguns preferem fazer o arroz da forma convencional e depois vai misturando os ingredientes. Eu, ao contrário prefiro fazer tudo junto.
Vamos agora resumir um pouco da história dos ingredientes em sua sequência de preparo?
Vamos lá…
Manteiga de Garrafa é o primeiro ingrediente que adiciono. Um produto 100% artesanal, brasileiro e de origem nordestina. Como o nome diz ela vem em garrafas, é liquida e facilmente encontrada nas Casas do Norte.
Carne de porco é o outro ingrediente que adiciono no início do preparo. Aqui vale uma ressalva. Geralmente utilizo bacon, porém já fiz com pernil e até com tender. Mas vamos focar no bacon. Ao contrário do que muitos pensam o bacon tem origem na Alemanha e migrou para os Estados Unidos onde se popularizou e até hoje é muito consumido. Outra versão diz que historicamente o bacon surgiu no início da domesticação de porcos na China a 4.900 A.C..
Na sequência vem a linguiça que pode ser a calabresa, a portuguesa ou o paio. Essas linguiças são curadas e defumadas ao contrário das outras que geralmente são frescas.
Você sabe a diferença entre elas? Isso é muito interessante. Vamos lá??
Tipos de Linguiça
Linguiça Calabresa – Tem origem italiana na região da Calabria. É originalmente feita de carne de porco ensacada em tripas, curada e defumada. Vem em gomos grandes e com pedaços de pimenta calabresa moída.
Linguiça Portuguesa – Ao contrário da linguiça da Calabria, os portugueses criaram a sua linguiça da mesma forma, porém ao invés da pimenta calabresa eles adicionaram pedaços de alho. Outra diferença é o formato. A linguiça portuguesa tem o formato de ferradura, tipo um U.
Paio – Diferentemente das outras duas, o paio é feito de carne bovina e carne suína, sem tempero e vem no formato de gomos pequenos. Dizem que surgiu também em Portugal.
Depois de fritar bem esses ingredientes, adiciono água e tempero com açafrão da terra também chamado de cúrcuma. O açafrão original é o indiano vem em talos e é caríssimo. Pra se ter uma ideia é mais caro que o ouro. Porém o nosso rico nordeste, nos deu o açafrão da terra, que tem a mesma coloração alaranjada, é muito mais barato e facilmente encontrado.
O chimichurri é um dos temperos que adiciono. Tem origem argentina e em formato líquido é muito utilizado em churrasco. Porém o formato seco, lembra um pouco o nosso tempero baiano, porém ao invés de moído vem granulado. Geralmente vem com cebola desidratada, alho, salsa desidratada, cominho, manjericão, orégano, páprica doce, pimentão verde e pimentão vermelho.
Após acertar o sal, eu adiciono o Arroz. Como faço em tachos prefiro utilizar o Arroz Parboilizado que é o mesmo arroz que o tradicional, porém ele é mergulhado numa alta temperatura e descansa ali por alguns minutos. Depois ele volta ao mesmo processo do tradicional. Esse mergulho faz com que ele ganhe mais nutrientes ao contrário do arroz tradicional que é polido. O preparo também é diferente, uma vez que como ele já teve um aquecimento, não é necessário tampar a panela como geralmente as pessoas fazem com o arroz normal. Aliás o nome Parboilizado vem da junção de duas palavras inglesas partial e boiled que significa “parcialmente aquecido”, ou seja algo como pré-pronto. O Ministério da Agricultura do Brasil vetou a venda com pré-pronto e assim surgiu o Parboilizado.
O feijão de corda é o penúltimo ingrediente que adiciono. Uma curiosidade desse feijão é que ao contrário do feijão carioquinha e de outros feijões, ele não precisa ficar de molho. O preparo é rapidíssimo, pois ele absorve a água e fica seco. Já fiz ele inclusive sem panela de pressão. Seu sabor também é marcante completamente diferente de outros feijões.
E para encerrar o último ingrediente, porém não menos importante, é o queijo coalho. Ao migrar para outras cidades do nordeste em carros de bois e cavalos, os viajantes armazenavam leite em bolsas feitas de bexiga de animais. Devido ao calor o leite coagulava e foi assim que surgiu o queijo coalho.
Como disse no início, existem várias receitas diferentes. Vale a pena conhecer e preparar essa receita maravilhosa.
E quer animar ainda mais a sua cozinha? Bota um forró de Luiz Gonzaga, o Rei do Baião. Eu indico a música “Baião de Dois”, composição de Luiz com Humberto Teixeira, um clássico que eternizou ainda mais essa delícia nordestina.
“Se um Baião é bom sozinho, que dirá Baião de Dois…”
Até a próxima.
Adorei as particularidades ! Detalhes fazem a diferença! Boa sorte,boa escri ta,sucesso.
Boa Alê, além de mandar bem na culinária, agora pode nos ensinar um pouco também sobre a nossa cultura nacional e suas origens!