As organizações que irão sobreviver no futuro próximo na sociedade da informação e do conhecimento são aquelas que, além de sustentáveis, também são inclusivas. Não podemos mais pensar o mundo produtivo sem que ele incorpore o contingente significativo e crescente de pessoas com deficiência, que historicamente foram excluídas do direito ao trabalho ou foram deslocadas para trabalhos precários, estereotipados e desprotegidos.
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) protege a Pessoa com Deficiência e deixa claro que é obrigação do lojista oferecer uma experiência de compra acessível a esse público – tanto no meio físico quanto no virtual. No entanto, para as pessoas com deficiência economicamente ativas, esse público é frequentemente esquecido e marginalizado.
Mas e quanto aqueles que nem se quer possuem um trabalho, para desfrutar da data ou comprar seus itens básicos de subsistência?
Sabemos que a interação das instituições de trabalho com o processo de inclusão de pessoas com deficiência tem sido marcada tanto por progressos legislativos quanto por desafios sociais. Apesar da Lei 8.213/91, regulamentada pelo Decreto 3.298/99, que estipula a obrigatoriedade de cotas para pessoas com deficiência em empresas com 100 ou mais empregados, até o início dos anos 2000 as organizações raramente enfrentaram pressão para cumprir essa determinação.
Temos acompanhado em nossa cidade ações de promoção da inclusão da PCD no mercado de trabalho. Feirões de empregos com vagas destinadas a esse público organizados pela SETRE Secretaria de Trabalho e Renda que oferecem a acessibilidade comunicacional com intérprete de libras e condições para entrevista inicial do processo seletivo.
Embora a Constituição de 1988 seja explícita ao afirmar que a inclusão é uma responsabilidade coletiva, muitas instituições, tanto públicas quanto privadas, resistiram durante décadas em integrar pessoas com deficiência no mercado de trabalho.
Esse panorama começou a se modificar por meio de diversos Termos de Ajustamento de Conduta (TACs), aplicados pela Justiça às empresas privadas. Como resposta, muitas dessas organizações recorreram a agências de recrutamento, entidades filantrópicas e redes sociais para contratar pessoas com deficiência, frequentemente sem priorizar uma inclusão real, mas com o objetivo de evitar sanções e multas. No âmbito do setor público, a atuação do Ministério Público, tanto em nível estadual quanto federal, foi essencial para assegurar o cumprimento das cotas reservadas em concursos públicos.
Com a publicação da Lei Brasileira de Inclusão (13.146/2015), os direitos das pessoas com deficiência no ambiente de trabalho foram consolidados, abrangendo desde o acesso até a garantia de condições igualitárias. Essa legislação reforçou aspectos cruciais, como o direito à acessibilidade e à participação plena, reafirmando o compromisso com uma inclusão mais efetiva.
O argumento tradicional de que a exclusão da população com deficiência do mercado de trabalho está ligada à sua suposta baixa escolaridade foi desmentido pelos dados do Censo 2010 do IBGE e recentemente atualizado pelo último CENSO 2022. Esses números indicam que os níveis de instrução das pessoas com deficiência aptas a trabalhar não diferem significativamente daqueles observados nas pessoas sem deficiência na mesma situação. Além disso, os relatórios da RAIS, do Ministério do Trabalho e Emprego, deixam claro que, sem a legislação atual da LEI DE COTAS, a contratação de pessoas com deficiência seria praticamente inexistente, o que evidencia que os obstáculos são muito mais de natureza sociocultural do que relacionados à qualificação profissional.
O cumprimento da legislação vigente é, portanto, o primeiro passo para promover a inclusão dessas pessoas, garantindo a reserva de vagas e as condições necessárias para sua inserção no mercado de trabalho. No entanto, essa é apenas uma etapa inicial. Após serem contratados, trabalhadores com deficiência enfrentam inúmeras dificuldades, que variam desde barreiras físicas, que limitam a mobilidade, até barreiras comunicacionais e informacionais, que afetam principalmente aqueles com deficiências sensoriais ou de linguagem, como os surdos. Entre todas, as barreiras atitudinais se destacam como as mais desafiadoras, por estarem profundamente enraizadas nos preconceitos e dispositivos sociais que perpetuam a exclusão das diferenças corporais.
O conceito de “barreiras atitudinais” surgiu no âmbito dos direitos humanos, inspirado pela metáfora das barreiras físicas enfrentadas por pessoas com deficiência. Essas barreiras se manifestam como preconceitos e atitudes negativas que subestimam o potencial e as capacidades desse grupo. Um exemplo disso é a crença de que uma deficiência em uma parte do corpo compromete todas as funções do organismo, inclusive as cognitivas. Outro equívoco comum é tratar pessoas com o mesmo tipo de deficiência como se tivessem necessidades idênticas, ignorando a singularidade de cada indivíduo. Isso reduz essas pessoas à condição de suas deficiências, desconsiderando suas histórias e características únicas.
Essas atitudes reforçam a desigualdade de tratamento, perpetuando termos pejorativos e estereótipos que desumanizam as pessoas com deficiência. O enfrentamento dessas barreiras exige a disseminação de informações e a convivência com essas pessoas em ambientes de trabalho, onde possam ter oportunidades de desenvolvimento, capacitação e contribuição. Quando se passa a enxergar a pessoa além de suas limitações, essas barreiras começam a ser eliminadas, fortalecendo o processo de inclusão.
Assim, além do cumprimento das leis, a segunda ação necessária para efetivar a inclusão é a remoção das barreiras atitudinais, combatendo preconceitos e promovendo uma visão mais humanizada e equitativa em relação às pessoas com deficiência.